O conflito de Gerações na Igreja

Ao entrar numa Igreja Adventista, no sábado pela manhã, é impossível não perceber a mistura de gerações dentro do templo. Logo ao entrar à porta e ao observar os primeiros bancos você consegue identificar pessoas de mais idade, com cabelos brancos e trajes formais. Andando de um lado para outro, adultos workaholics organizam as atividades que acontecerão durante o culto. 

Chegando aos poucos, jovens adultos ocupam os lugares intermediários trajando jeans e tendo uma aparência de pressa, na maior parte do tempo. 

Ao fundo você poderá perceber adolescentes que hora conversam entre si, ora mergulham no smartphone em suas mãos. Bebês choram. Crianças correm, tentando não serem impedidas por seus pais... Pessoas de todas as idades, unidas para adorar o Criador.

O que precisa ser entendido é que cada um destes grupos de pessoas nasceu em uma época diferente da outra, com valores e eventos totalmente distintos, com tecnologias que moldaram seus pensamentos e isso trouxe um impacto sobre sua maneira de enxergar a vida. 

Para facilitar a compreensão destes grupos de pessoas, as ciências sociais os dividiram no que chamamos hoje de gerações.

Compreender as gerações é uma tarefa essencial para o líder de igreja que deseja servir a Cristo com todo o seu potencial. Saber que os indivíduos tendem a apresentar os padrões de comportamento típicos de sua geração põe o líder em uma certa vantagem no tocante à mobilização e à resolução de conflitos.


Nesta aula vamos apresentar as características mais latentes das gerações ativas no ambiente atual da igreja e procurar descrever seu perfil geracional.

BABY BOOMERS (1945-1965)

Após o término da Segunda Guerra Mundial, os soldados que retornaram para seus lares podiam agora construir famílias em paz. Assim, houve uma explosão na taxa de natalidade, um “boom” de bebês. É daí que vem a expressão Baby-boomer, que designa a geração que viveu no Brasil do regime militar. Seu mundo era marcado por respeito e autoridade. Suas famílias eram grandes e seus pais dividiam a atenção entre dezenas de filhos. 

O ambiente econômico era instável e eles tiveram que assumir responsabilidades muito precocemente. Em um sábado qualquer às 5 da manhã, os Baby-boomers adventistas já estão de pé. Estudam a sua lição, cantam um hino, leem a sua Bíblia, ajoelham-se e agradecem a Deus por mais um dia de vida. Após sua refeição, já começam a aprontar-se ansiosamente para o culto. 

Os adventistas da geração Baby-boomer cresceram em um mundo sóbrio e isso influencia bastante em suas escolhas. Seus trajes sociais pouco coloridos, sempre limpos e bem-passados demonstram o seu zelo e compromisso, afinal eles separaram a sua roupa mais bonita para o sábado. Seus cabelos brancos bem penteados demonstram o asseio próprio desta geração.

Eles são pontuais, afinal “igreja é coisa séria”. Geralmente os Baby-boomers são os primeiros a chegar na igreja. Quando as portas do templo se abrem, eles dobram mais uma vez seus joelhos, para mais uma prece silenciosa. Acomodam-se em seus lugares, logo nos primeiros bancos, enquanto esperam que comece o serviço de cânticos.


Quando este se inicia eles abrem seus hinários põem seus óculos de grau e louvam a Deus com todas as suas forças enquanto aguardam o início da Escola Sabatina.

No mundo em que eles viveram, a escola não incentivava a participação. Portanto, na maior parte das vezes, suas vozes não são ouvidas após os pedidos de oração. 

Como bons Baby-boomers, eles sabem que estão ali para aprender, e, se o professor está nesta posição é pela razão óbvia de que ele é o transmissor do conhecimento. E assim eles seguem, em total silêncio, até o fim do culto, levantando-se apenas se tiverem alguma participação na liturgia sabática. Até porque, coisas triviais como ir ao banheiro e beber água podem esperar até o final do culto.

GERAÇÃO X (1965-1979)

A geração X assistiu ao fim do regime militar, e viram a inserção da mulher no mercado de trabalho. Eles também assistiram e participaram do crescimento da Igreja Adventista do Sétimo Dia no território sul-americano.

Os adventistas da geração X foram treinados para liderar a igreja.

Por fazerem parte do elo geracional entre os mais jovens e os mais velhos, são naturalmente vistos como o ponto de equilíbrio. 

O culto de sábado para eles começa bem antes disso, afinal eles são anciãos, líderes do ministério da mulher, professores na escola sabatina, líderes de mordomia cristã, diretoras de Aventureiros e talvez eles exerçam, até mesmo, muitas destas atividades simultaneamente. Eles têm que fazer as escalas, preparar o programa, ligar para os convidados, dentre outras coisas. 

Sem dúvidas, liderar a igreja não é nada fácil! Eles participam das comissões, reuniões, opinam e tem um senso de que é de suma importância “trabalhar para Deus” - até mesmo os adventistas da geração X que não são na igreja acreditam firmemente nisso.

Num sábado pela manhã, você vai sempre os ver em atividade...


Alguns nem sequer se sentam, diante de tantas atribuições! Enquanto o culto se passa, alguns deles já estão preparando-se para uma reunião de planejamento ou outra atividade do sábado à tarde. Seu senso de dever é louvável. Sua responsabilidade é gigantesca. Por isso, eles sofrem ao ver que muitos não fazem a sua parte na igreja e quando os apelos por trabalho não são atendidos pelos demais, eles ficam, por muitas vezes, frustrados.

Os adventistas da geração X também são muito comprometidos com os planos do campo local. Um plano da União ou da Associação sempre é recebido como algo que vem agregar, até porque “eles são os nossos líderes, e nós temos que respeitar a hierarquia”. Eles chegam a sentir uma vergonha profunda ao ver o desinteresse dos mais jovens por questões hierárquicas e temem que a igreja perca os valores tradicionais que os atraíram à fé.

GERAÇÃO Y (1980-2000)

A geração Y viu o surgimento e a popularização da internet, dos computadores, notebooks e dos smartphones. Eles usaram a internet discada, a rádio, a cabo, wireless, wi-fi e 4G. Por fazerem parte de um mundo em constante atualização, tendem a ser mais impacientes e impulsivos, sempre em busca de novidades. Esta é uma geração que não apenas quer assistir às mudanças do mundo, mas quer protagonizá-las.

Os adventistas da Geração Y estão começando a ganhar espaço na igreja, mas o seu jeito de viver e transmitir a fé ainda causa certo choque com as gerações passadas. Se chegar cedo nos cultos é um prazer para a geração Baby-boomer e um dever para a geração X, para a geração Y é quase um sacrifício. 

Numa manhã convencional de sábado eles colocaram o smartphone para despertar e ativaram o modo soneca diversas vezes. Vencer o sono matinal não é coisa simples para eles. Mas não se engane, isso não é falta de compromisso.


É que eles tiveram uma infância prolongada, em comparação com as outras gerações e demoraram a assumir responsabilidades.

No sábado pela manhã, eles dificilmente escolherão um paletó convencional ou um vestido tradicional para ir à igreja (a menos que tenham que pregar nesse dia, mas ainda assim seus trajes terão traços de jovialidade e não de formalidade). O jeans é uma marca registrada da geração Y e o seu estilo de roupas quase sempre é informal.

Na classe da escola sabatina, se eles se interessarem pelo assunto, esteja pronto para ouvir as suas opiniões e às vezes até mesmo debates controversos de ponto de vista. É a partir desta geração que a expressão “não concordo!” ganha espaço no ambiente da igreja. 

Ao terminar a escola sabatina, provavelmente você verá um Y sendo convidado para entoar uma canção solo na congregação. Se a música e a performance forem do agrado dos seus colegas, smartphones começam a erguer-se sobre as cabeças dos membros da igreja. É conexão em tempo real. 

Os Y vivem uma vida dividida entre o off-line e o on-line. Sempre à procura de fazer conhecidos os seus melhores momentos. Quando o sermão inicia, o pregador sem muita habilidade encontrará obstáculos para atrair a atração deste público. Eles são exigentes e tem um aguçado senso crítico. Por isso, ao término do sermão, eles emitirão as opiniões mais diversas sobre determinados pontos da mensagem.

Vale lembrar que esta é a geração dos questionamentos. “Por que devo fazer isso?”, “Por que não devo fazer aquilo?” são perguntas que refletem o mundo no qual cresceram: um mundo que começou a ouvir os mais jovens. A hierarquia para eles não tem tanto valor. Se você quer conquistá-los, não será por sua posição ou status (eles desafiam isso, por sinal). Para os adventistas da geração Y só há um caminho para um relacionamento saudável: a amizade.

Esta também é uma geração multifuncional e inovadora. Fugir da rotina e da mesmice é quase um imperativo para a Geração Y. Criatividade e estilo são traços latentes deste grupo geracional. Por isso, não estranhe quando algum deles abordar você com uma proposta do tipo: “E se a gente fizer diferente?”.

GERAÇÃO Z (2000-2010)

Esta geração é conhecida como os nativos digitais. Eles viram o surgimento do IPhone e cresceram num mundo com banda larga e fast-food. A comunicação é instantânea, a alimentação é instantânea, a vida para eles tem que ser instantânea. Eles fazem parte de uma geração de pais ausentes que se dedicaram por vezes excessivamente ao trabalho e, por isso são acostumados a uma vida solitária e dedicada ao ambiente virtual.

No sábado de manhã, a galerinha da geração Z levanta-se para ir a igreja quase que arrastada. Por serem avessos à rotina, poucas vezes eles estudam a lição ou até mesmo a Bíblia.

Muitos deles sequer sabem o que significa o culto familiar. No caminho até a igreja eles estão grudados no smartphone. Eles gostam de sentar-se ao fundo, para não chamar atenção, de preferência próximo aos seus amigos - e é possível que mesmo estando um ao lado do outro, eles estejam comunicando-se pelo WhatsApp. E assim eles permanecerão: ora levantando a cabeça para ver algo na programação que chamou à sua atenção, ora voltando para interagir com o mundo em suas mãos, no seu smartphone. É difícil compreender isso, mas esta é uma geração dataholic 3, eles trazem referencias de memes ou tendências digitais para suas conversas e caso você não saiba, vai ficar voando, por que eles não têm paciência para explicar.

Os Z transitam entre muitos grupos. Eles vivem em um mundo plural e tem contato com diferentes opiniões. Para eles, não há discriminação de nenhuma ideologia, o que os torna altamente inclusivos. Por isso, muitas vezes eles são avessos à polarização de ideias, buscando sempre encontrar um meio termo que aniquile o debate. Assim, não se surpreenda se eles acharem alguns posicionamentos da igreja “radicais demais”.

Diante disso, fica claro o motivo pelo qual eles não gostam se definir. Afinal, “quem se define, se limita”. A fé deles, portanto, pode ser expressa de uma maneira um tanto fluida e às vezes até contraditória para as outras gerações (Sabe aquela jovem da igreja que colocou no perfil do Instagram “adventista e sagitariana”? Pois é, ela faz parte da geração Z).

E AGORA?! QUEM PODERÁ NOS DEFENDER?

É provável que depois de conhecer as gerações e ver as gritantes diferenças entre elas você esteja pronto para gritar desesperadamente pedindo por socorro. Mas acalme-se. Aí vão algumas dicas para você evitar e/ou lidar com os conflitos de gerações em sua igreja.

1. Incentive o diálogo

É conversando que a gente se entende. Promova em sua igreja não apenas programas, mas também conversas entre as gerações. Faria bem aos mais jovens ouvir como era a igreja em tempos passados (se tiver fotos, melhor ainda!), e é bom para os mais velhos ouvir dos mais jovens o que os deixa confortáveis na igreja. Conduza momentos assim e você verá as pessoas se entendendo.

2. Forme pares/duplas intergeracionais de oração/visitação/estudo

Uma interação mais pessoal entre membros de diferentes gerações é extremamente positiva. Eu mesmo aprendi muito enquanto saía para visitar com pessoas de mais idade que a minha. Assim, estimulando o aprendizado mútuo, os mais velhos aprendem a simpatizar com os mais jovens e os mais jovens a respeitar a experiência dos mais velhos.

3. Planejamento Participativo:

Existe uma mania de achar que apenas os mais experientes devem participar dos planos e executar ações em favor dos mais jovens. As novas gerações querem ser ouvidas, e, de fato, eles podem contribuir muito. Se você está à frente de alguma atividade, tanto na hora do planejamento quanto na hora da execução, faça o possível para incluir o máximo de gerações.

CONCLUSÃO

O estudo das gerações é essencial para os líderes do mundo atual. Aqui, você teve apenas um vislumbre das complexidades geracionais. É válido salientar que os padrões apresentados aqui representam a maioria, mas nunca a totalidade dos indivíduos de uma geração. Há, ainda, aqueles indivíduos que, embora tenham nascido no período de tempo de uma determinada geração, encontram-se deslocados da mesma, identificando-se mais com os valores de uma geração anterior ou posterior. Por isso, essa abordagem simples apenas resume a complexidade do assunto.

Além do mais, uma nova geração está se levantando. É a geração Alpha, formada por aqueles que nasceram depois de 2010. Eles já estão no clube de Aventureiros e de Desbravadores, nós não temos ideia de quais são os padrões de comportamento que eles irão apresentar.

À medida que o tempo passa, se torna cada vez mais necessário compreender a visão de mundo que os indivíduos possuem, para que o diálogo com eles tenha o maior proveito possível.

O líder de jovens precisa entender as mudanças no mundo e os efeitos que elas produziram em cada geração. Agora, é tarefa sua qualificar-se para exercer o seu ministério com excelência e para que o nome do Senhor seja lembrado “de geração em geração” (Sl 45:17).

1. Termo de origem inglesa utilizado para descrever pessoas que tem comportamento compulsivo com relação ao trabalho.

2. Embora haja divergência entre as datas que marcam o limite entre a passagem de uma geração para outra, optamos por manter estes marcos temporais por motivos didáticos.

3. Termo de origem inglesa, utilizado para descrever os indivíduos que gasta muito tempo navegando na internet e apresentam certa ansiedade quando são privados do uso da tecnologia.


Onde posso aprender mais sobre esse assunto?

Programa Teólogos NT #22 Novas gerações ★ https://www.youtube.com/watch?v=0m5UIZukmk8c
REIS, Douglas. Explosão Y. Maringá, IAP: 2013.
Jornal da Globo Matéria Gerações ★ https://www.youtube.com/watch?v=mo5vVgNHuww
Z Geração do Agora ★ https://www.youtube.com/watch?v=ssl5VXD_X5I&t=34s
Canal Livre/ LUÍS FELIPE PONDÉ Gerações X, Y e Z ★ https://www.youtube.com/watch?v=mX6hAChLz5A

Fonte: Revista Ação Jovem, 22º Trimestre 2022.